(Maracatu final da aula-espetáculo de Ariano Suassuna - de terno branco, no canto do palco. Foto de Luiz Carlos Figueiredo.)
Só pra assistir à abertura já valeu a pena ter ido à Fliporto, a IV Feira Literária de Porto de Galinhas, PE. Consistiu de uma aula-espetáculo do grande escritor Ariano Suassuna, atualmente com 81 anos de idade, que é Secretário de Cultura do Estado. Com inteligência, originalidade, humor imbatível e vitalidade, Ariano conduziu o espetáculo Nau – Sagração nº 2, um passeio musical por diferentes momentos da história brasileira. Foi acompanhado por cinco músicos profissionais, dirigidos pelo maestro Antônio Madureira, e também por cinco bailarinos, dirigidos por Maria Paula Costa Rêgo, estes egressos de regiões pobres do Recife, resgatados por programas sociais. Músicos e bailarinos são hoje funcionários da Secretaria de Cultura, “meus assessores”, como os definiu Ariano; achei isso bacana. Finalizado com um maracatu, o espetáculo foi um deslumbre de beleza, competência e sensibilidade. Penso que, no conjunto, os artistas pernambucanos e os radicados em Pernambuco são os que melhor e mais alto sabem elevar a cultura popular brasileira.
Bom, mas se tratava de uma feira literária, este ano tendo como tema o diálogo entre escritores africanos e latino-americanos. Diferente das bienais do livro, nas feiras literárias todos os participantes, escritores e leitores, ficam por ali, participando dos eventos, papeando, se conhecendo. Assistimos às palestras e passeamos todos por Porto de Galinhas (eleita de novo a melhor praia do Brasil), cuja vila, normalmente encantadora, estava apinhada de gente descobrindo comidinhas, artesanatos e livros.
Achei particularmente interessante assistir às conversas entre os escritores africanos, que, ainda pouco conhecidos por aqui, desta vez compareceram em grande número. Eles e suas histórias se parecem tanto conosco... mas ao mesmo tempo são diferentes, como são diferentes entre si os de Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné Bissau, São Tomé e Príncipe. Estavam lá desde escritores consagrados, como o angolano Pepetela, Prêmio Camões de 1997, autor, entre outros, de Jaime Bunda – Agente Secreto; até autores ainda jovens mas já reconhecidos, como José Eduardo Agualusa (que tem quatro histórias sendo filmadas,uma delas pela Conspiração Filmes; é autor do excelente O Vendedor de Passados, sobre um sujeito que vendia passados em Angola, isto é, falsas genealogias e falsos feitos – “Já que não se pode mudar o futuro das pessoas, ele mudava o passado”, nos explicou Agualusa); até jovens como o angolano Odjaki, autor de um delicioso livro, que estou terminando de ler, Os da minha rua (Rio, Língua Geral, 2007), sobre a vida de crianças em Luanda.
Gostei também de conhecer uma escritora moçambicana, Paulina Chiziane. Ela mostrou como, no passado, via e lia o mundo através de um véu; mas, decidida certo dia a retirar esse véu, pôde ver, ouvir e recontar as histórias secretas das mulheres de Moçambique, “aquelas que os homens, mesmo quando as conhecem, não entendem”, nos explicou. Foram muitas descobertas na Fliporto. A verdade é que a gente sabe tão pouco sobre a África em geral, sobre a África de fala portuguesa, sobre a literatura em português da África... Vim carregada de livros, para tentar diminuir a minha ignorância.
Entre os brasileiros, também muita diversidade, gente desde o venerável Thiago de Mello até autores jovens, como Bruno Piffardini, que estão surgindo e divulgando seus escritos principalmente nos blogs. Havia também estudiosos de literatura; destaco a palavra sempre inteligente de Cláudio Willer e uma palestra sensacional de Antonio Carlos Secchin, sobre a ausência de paternidade e a adoção de pais substitutos em José de Alencar, Mário de Alencar (filho de José) e Machado de Assis.
Gente, foi bom demais, quis dividir um pouco com vocês.
[Muito obrigada a todos pelos recadinhos deixados nos blogs durante minha ausência. Estou descobrindo que a blogosfera pode ser muito carinhosa. A-do-ro isso!]
10 comentários:
Janaína, eu adoraria ter ido!
O que eu mais queria era conversar com Paulina Chiziane. Anos atrás, fiz parte de um grupo de pesquisa sobre os autores africanos de expressão portuguesa e conheço um tiquinho desse universo.
Beijos,
Maria Muadiê, teria sido muito bom você ir, sim, inclusive porque a gente teria tido a oportunidade de se conhecer. Achei a Paulina Chiziane muito digna, super firme nas suas posições, que no entanto eram apresentadas com bom humor. Era a única mulher na conversa dos moçambicanos, e colocou todos os seus colegas no chinelo.
Sua passagem por Porto de Galinhas foi mil vezes melhor que a minha. Fui em janeiro e era só praia cheia de turistas e comerciantes enlouquecidos querendo vender tudo e mais alguma coisa. À noite, era barzinhos superlotados com os filhinhos de papai com seus carrões abertos e nos obrigando a ouvir sons insuportáveis. Fui para passar dez dias, só aguentei cinco.
Janaína, fiquei aqui imaginando e tentando entrar na festa.
Realmente deve ter sido uma festa fascinante.
Coisa para guardar na memória.
Um beijo meu bem.
Ôi, tudo bem? Gostei muito do teu blog. Voltarei sempre. Grande abraço.
Volte sempre, sim, Nelson. Muito bom receber sua visita! Menina da ilha, você vê que um mesmo lugar pode se transformar completamente, dependendo de quem anda por lá na ocasião, né mesmo? Qdo. fui, só dava escritor e gente ligada às letras, tudibom. Aninha, eu gostaria de ter tido a sua companhia nessa festa!
Estou lendo com um pouco de atraso o seu relato sobre a Fliporto. Queria mesmo saber as suas impressões; acho que você aproveitou bastante. Sinto não ter conhecido um pouquinho dos nossos colegas africanos de língua portuguesa e não ter visto o espetáculo comandado por Ariano.
Bjs da Giza
Boa noite, Janaína... estou muito feliz por tê-la como companheira para essa homenagem a Florbela. Obrigada pela divulgação e participação!
Bjs. e um excelente final de semana!
Flor ♥
Janaina
Que passeio cultural, como e bom navergarmos em conhecimento, saber mais.
Obrigada por compartilhar.
Beijinhos e boa semana.
Puxa, coisa de invejar mesmo! Que festa linda essa! Por que não acontece algo assim por aqui?
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